segunda-feira, 4 de abril de 2011

Orçamento e gestão pública (artigo)

O Brasil é um país de vastas dimensões geográficas, por isso mesmo abriga em seu território uma grande diversidade de culturas e diversas desigualdades sociais. O país conta um orçamento público complexo e enfrenta enormes desafios que requerem políticas públicas adequadas, voltadas à substancial melhoria do desempenho do setor público e de suas organizações. Melhorar a qualidade da gestão através do orçamento público, que tem um enorme potencial, tanto no nível macro quanto no organizacional, demanda pôr foco nas questões que predominam o debate sobre o orçamento público.

O acúmulo de compromissos financeiros decorrente de medidas para sustentar a estabilidade monetária, como o cumprimento dos contratos firmados com credores externos e internos, em um contexto de vulnerabilidade econômica, determinou o aumento da rigidez orçamentária. Apesar do extraordinário incremento na arrecadação de impostos, menos de 10% do orçamento público está de livre utilização. Há, portanto, uma pequena margem de manobra, pois juntamente com os compromissos financeiros, os direitos sociais e previdenciários, a universalização do ensino fundamental e das ações básicas de saúde, os programas assistências e o auxílio desemprego compõem o elenco de direitos que absorvem uma parte considerável do orçamento público. De um lado, a vinculação dá garantia de continuidade ao atendimento às demandas críticas da sociedade, de outro, introduz a rigidez no orçamento.

A ausência de visão a longo prazo, o risco de descontinuidade e a dificuldade de reavaliação também são problemas que compõe a elaboração e a execução orçamentária. Diversos são os riscos que estes fatores ensejam em si, entre os quais, o distanciamento da elaboração orçamentária e os destinatários dos recursos, o contingenciamento, a interferência política e o não atendimento às demandas da sociedade. O grande paradoxo é que temos cada vez mais programas e organizações complexas e falta capacidade técnica operacional, que provoca resultados socialmente indesejáveis, portanto, o foco do ajuste precisa se deslocar da visão meramente contábil para o enfrentamento dessas questões que se encontram na origem dos desajustes atuais. É indispensável rever o modelo do federalismo fiscal e o conceito de seguridade social.

Por tudo isso, importante compreender as ações do governo, orientar os agentes públicos e privados, atender às necessidades da população e contribuir para a vitalidade da democracia, dessa forma, o orçamento “ideal” teria que se focar nos resultados e ter a orientação de suas ações voltadas aos “clientes”, gerando mais transparência e mais accontability.

Trabalho no Senado Federal e atuo dentro do processo legislativo, que envolve, entre outras coisas, o acompanhamento do orçamento público na sua elaboração, aprovação e execução. A Comissão Mista de Orçamento Públicos do Congresso Nacional – CMO, recebe a Lei de Diretrizes Orçamentária – LDO, geralmente em abril, para, através do seu rito ordinário, ratifica a Lei Orçamentária Anual ao final do ano.

O orçamento chega como uma peça de ações e programas que visam atender as demandas da sociedade e das organizações instituídas. Contudo, fatores como a rigidez orçamentária, o contingenciamento dos recursos, a falta de políticas de longo prazo e a ausência de mecanismos de reavaliação, dentre outros, dificultam a aprovação e a execução do orçamento como um instrumento poderoso de gestão pública.

A interferência política talvez seja um dos fatores mais visíveis dento da minha instituição, seja para o bem, seja para o mal. Diversos são os fatores que influenciam a condução dos trabalhos, entre os quais, a escolha dos dirigentes e relatores, tanto gerais como setoriais. Obviamente as maiores agremiações indicarão seus representantes, que comporão os cargos mais importantes da comissão. Todavia, decerto que a análise orçamentária envolve ferramentas quantitativas, a análise racional, contudo, pode subsidiar o processo negocial, entretanto, isso não acontece como deveira. O governo eleito, através do atual sistema, terá obrigatoriamente a maior bancada e uma demanda ascendente, que transformará votos em moeda de troca.

É preciso melhorar a qualidade dos gastos e da gestão público, ainda que dentro de uma reforma administrativa, o Brasil não pode esperar. A dívida pública é um exemplo dessa “chaga”, enquanto a rigidez orçamentária volta-se para a exigência de superávits fiscais para garantir o pagamento dos encargos financeiros, que manterá estreitas margens orçamentárias para a expansão dos investimentos públicos num ambiente de organizações complexas e profundas desigualdades sociais.

Portanto, as distorções políticas, fruto de um sistema eleitoral viciado, transforma as regras do jogo em benefício de interesses menores. A eleição da gestão pública põe em relevo a necessidade de se avançar mais rapidamente em mudanças qualitativas na formulação e na gestão do orçamento federal, como a submissão das decisões orçamentárias e diretrizes estratégicas estabelecidas mediante um amplo debate público, maior ênfase na melhoria da gestão do orçamento e novos processos e conceitos que visem reduzir o incrementalismo.

Fernando Neves de F. Banhos
FGV / CIPAD – 8
Orçamento Governamental
Professor Armando Cunha

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